Pepe, o hipopótamo
"Ele foi tirado à força de sua terra natal, transportado em condições precárias, vendido no mercado ilegal, encarcerado. Tratado como bicho exótico ou peça de museu, foi exibido como artigo de luxo até a morte daquele que se dizia seu dono. Foi abandonado, passou fome, viu os vigias fugirem para outras terras e então resolveu sair pelo mundo. Pepe, o hipopótamo, levou com ele sua companheira e, juntos, deram vida a um incontável número de filhotes que deixaram atrás de si um rastro de destruição e morte. Você pode pensar: “e o que eu tenho com isso?”. Mas só até descobrir que o Pepe está crescendo bem perto de você".
Projeto do Núcleo Tumulto com ações em múltiplas linguagens, "Pepe, o hipopótamo" contempla a Instalação Multimídia que esteve em cartaz no Museu da Imagem e do Som de Campinas em 2019, práticas pedagógicas de escrita criativa, intervenções de arte urbana com stickers e lambes, práticas de deriva e performances em espaços públicos que culminam na criação de um trabalho cênico ainda em fase de realização.
O projeto é composto de indefinidas tentativas de falar sobre as implicações do narcotráfico nas relações humanas nas últimas décadas, desde as mais ordinárias e cotidianas aos macro negócios e políticas transnacionais. Trabalhando a partir de um tema ainda tabu no debate público - mesmo extremamente explorado pelas comunicações de massa e produtos culturais em diversas linguagens - o Núcleo Tumulto busca mirar aqueles que pensam não sofrer implicações diretas desse mercado e suas ramificações, a partir da metáfora do problema ambiental causado pelos hipopótamos fugidos da Fazenda Nápoles, na Colômbia, de propriedade do narcotraficante Pablo Escobar.
ProAC Criação e Publicação Literária - Texto de Dramaturgia | 2018
Secretaria da Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo
Resistir para permanecer
Em 2016, logo após a última temporada de Cachorro Urubu, o Núcleo Tumulto começa a debater a ideia de realizar uma nova fase de pesquisa cênica a partir da história da proliferação dos hipopótamos nas regiões rurais da Colômbia. Haviam dois possíveis projetos em pauta, mas, aos poucos, as conversas sobre o Pepe e todo o universo que o rodeia passaram a tomar um espaço maior nos planos do grupo, cuja principal motivação era a possibilidade de continuar trabalhando juntos. A chegada da atriz Carolina Portella agregou as possibilidades de experimentações sonoras que já eram de interesse do grupo, tais como a execução ao vivo das musicalidades e sonoridades que compõem o trabalho.
Foi preciso estabelecer múltiplas estratégias para permanecer existindo enquanto núcleo de pesquisa cênica, diante de cenários poucos favoráveis na condução das políticas públicas para as artes e das dificuldades econômicas enfrentadas nos últimos anos em nível municipal, estadual e nacional. Os novos integrantes Jéssica Policastri (produtora) e Bruno Mourão Guzzo (assessor de imprensa) foram convidados para integrar a equipe neste contexto.
A impossibilidade dos integrantes de realizar o trabalho do grupo de forma exclusiva impulsionou outras práticas artísticas e pedagógicas que se tornaram experiências importantes para o desenvolvimento das pesquisas formais e temáticas do Núcleo Tumulto. O longo processo de maturação do novo projeto foi muito influenciado por estas condições tantas vezes precárias para a realização de trabalhos artísticos no Brasil. Ainda assim, segue-se elaborando modos de vida e produção, estratégias de resistência e criação de vínculos afetivos e efetivos, que permitam a permanência e continuidade do trabalho do grupo. É neste contexto que, a convite do Teatro da Vertigem, o Núcleo Tumulto participa do projeto Teatros em Movimento, juntamente com o Grupo Pandora de Teatro, onde realizará mais uma tentativa de tratar desse assunto, de contar essas histórias, de partilhar essas formas de estar no mundo, mesmo com quem pensa "não ter nada com isso".
Em 2018, "Pepe, o hipopótamo" foi contemplado pelo edital ProAC de Criação e Publicação Literária de textos de dramaturgia. O financiamento de parte do processo criativo proporcionou também a realização das primeiras ações artísticas e pedagógicas do projeto. Foram realizadas leituras públicas, oficinas de escrita performativa, intervenções de arte urbana e exposição multimídia na cidade de Campinas nos meses de agosto e setembro de 2019.
Seguimos resistindo.